13/03/2005
REALIDADE E FICÇÃO NO SHOW DA VIDA
Mário Sérgio Mello Xavier* ( indaga1@hotmail.com )
Em 1949 o escritor britânico George Orwell, cujo nome de batismo era Eric Arthur Blair, publicou sua obra de maior sucesso, o clássico da ficção científica denominado “ 1984”. O livro, leitura obrigatória para qualquer um que se interesse por tecnologia, descrevia um futuro no qual o governo, representado pelo “Big Brother”, um ente fictício porém onipresente, tudo sabia sobre cada cidadão e interferia diretamente em suas vidas, monitorando todos os seus movimentos
Bem sabemos, que a briga aqui por um bom emprego ou uma boa remuneração, anda muito “Big” e este acirramento da concorrência entre as empresas produz a concorrência entre os funcionários no interior de cada empresa. Dentro de cada empresa, assim como em cada grupo do BBB, há uma surda disputa pelo prêmio/emprego, que é o de permanecer na casa/empresa, em face do risco do paredão/desemprego. A ameaça de desemprego paira com o medo da indicação, que ao contrário do que parece, elimina suas chances, assim como nos programas televisivos o fuzilamento público os espera no inclemente paredão.
Este escriba aqui que vos endossa, faz parte também deste Big Brother da briga pelo espaço e o reconhecimento remuneratório e profissional, que muitas vezes são de pessoas, que cronologicamente, possuem mais tempo com os olhos abertos do que eu. O ambiente corporativo contemporâneo manifesta de fato, aspectos doentios que o aproximam dos “reality shows” competitivos. Ao mesmo tempo que todos disputam virtualmente as mesmas vagas, ou seja, querem destruir uns aos outros, todos tem que encenar um show e trabalhar juntos, construindo o ambiente fictício de uma amistosidade forçada. Por trás da convivência forçada dos “bom dia”, “boa tarde”, “até amanhã”, vicejam a inveja, a intriga, as fofocas, a adulação, a traição, etc...
A "teatralidade" falsa desse "show da vida" chamado Big Brother, mais do que reduzir a pó o verdadeiro sentido do teatro, nos obriga a sermos ainda mais teatrais, na busca da arte no palco da vida real. As novelas, estas vem buscando impor uma novo estilo libertino, onde tudo se pode. Se prestada bem a atenção, uma única atriz, numa única novela, passa pelas mãos de todos os demais atores. Homossexualidade, traição, corrupção, racismo, vida cheia de glamour e materialismo. Será que mostrando isso ela ajuda a sociedade de alguma forma? Polêmica que deve ser discutida.
Basta entrar numa sala destas de “Bate Papo”, para ver os apelidos, geralmente com nome do casal de mulheres desta última novela, nome da tão falada Nazaré, adolescentes, que se inspiram, mais do que nunca, facilmente em filmes, novelas e agora em reality shows.
Menos visível, esse Big Brother é muito mais violento do que o Bial Brother que nos diverte no fim da noite na televisão todos os dias. E outro Brother, o George Bush, pretende que ele ainda se torne mais poderoso, dedicando verbas astronômicas a um novo Departamento Governamental onde todos os americanos serão catalogados e controlados, a começar pelos imigrantes.
Imagine que dentro de algum tempo o implante de chips venha a substituir, por exemplo, a carteira de identidade. Há quem advogue esta medida por questões de segurança. De fato, quem tiver implantado um desses chips e viver em uma região dotada de uma eficiente rede de sensores (e, não se iluda, se a moda “pegar”, toda cidade e a maioria das estradas serão dotadas destas redes ligadas a computadores centrais) ficará praticamente imune a seqüestros. E será praticamente impossível usar cartões magnéticos de terceiros para efetuar transações financeiras.
Estas tecnologia invadem o nosso cotidiano e muitas vezes não percebemos, estão por toda parte, o mais recente está na área telefônica. Tudo isso beneficiaria de um certo modo a praticidade, a segurança e muitas outras coisas, mas em contrapartida, em um cenário como esse, não há como impedir que autoridades governamentais, democráticas ou não, sejam capazes de traçar todos os movimentos de qualquer cidadão, honrado ou não. Em suma: é o Big Brother com vinte anos de atraso. Os milionários filmes de ficção científica ou da própria vida real, no Iraque e no Afeganistão, demonstram bem a capacidade disso tudo se tornar realidade.
Sugiro se manter informado sobre este novo modo de vida que nos é imposto ultimamente. Mas, seja qual for sua posição filosófica, uma coisa é certa: já existe tecnologia mais que suficiente para criar um mundo no qual o Big Brother se estabeleça soberano. Se isso ocorrerá ou não, dependerá da reação da sociedade ao uso das novas tecnologias.
Se você ainda não sabe de que lado está, é bom tomar partido. Porque eu até admito que, por uma questão de comodidade e aparente segurança, se adote deliberadamente a opção de ser escravo de máquinas ou governos (sem mencionar religiões). Desde que, naturalmente, se tenha plena consciência disso...
*Academico de Direito da ULBRA