MELANCIAS, GALINHAS E OUTRAS DELÍCIAS
Dídimo Heleno Póvoa Aires*
12/12/2004
Antigamente,
a infância e a adolescência passadas nas cidades do interior revelavam
situações inusitadas. Naquela época, quando o sexo ainda não era tão
banalizado como hoje, os rapazes viravam-se como podiam. Estupefato, ouvi
de um conhecido, já no alto dos seus mais de cinqüenta anos, o seguinte
relato: quando menino, teve um caso com uma melancia. É isso mesmo:
durante algum tempo, o sujeito “fez amor” com uma melancia. Descobriu
que, fazendo um buraquinho na casca da fruta e introduzindo o bilau por
ele, a sensação era, na sua imaginação, a de algo parecido com sexo de
verdade, pois ao atingir o interior macio, avermelhado e úmido as mais
diversas loucuras eram fantasiadas naquela cabeça perdida. E durante
algum tempo escondeu no quintal da casa de seus pais uma paixão secreta:
a rechonchuda e rajada melancia. Esse efêmero e avassalador romance
acabou-se assim que ela apodreceu.
Hoje,
os garotos fazem amor com seres bem mais interessante, ou seja, as
garotas. Já não precisam recorrer ao último dos recursos e se
relacionarem com vegetais ou animais irracionais. Sortudos, esses meninos
de agora. Além das melancias, outras vítimas eram submetidas ao sadismo
dos meninos de outrora, tornando-se verdadeiras escravas sexuais: as
galinhas. Sim, a ave! Por falta de um lugar mais apropriado para
introduzir os pequenos pênis, os garotos contentavam-se com as cloacas
quentes dos pobres galináceos. E o mais trágico de tudo era que, não
raro, após o ato de atrocidade, as pobres morriam com os olhos revirados.
Muitos foram os meninos que ficaram famosos
“por matarem de amor” as pobres bípedes.
Das
melancias da infância, o sujeito passou para as galinhas e começava a
progredir. Agora, já na adolescência, seus alvos prediletos eram as
bezerras, burras e éguas. As novilhas, apesar de arredias, tornaram-se as
preferidas. As burras e as éguas, por serem muito altas, obrigavam-no a
encontrar uma boa casa de cupim, para nela subir e alcançar o local
desejado. Para se “fazer amor” com esses animais maiores, segundo o
relato do meu conhecido, necessitava-se de duas pessoas. Enquanto uma
subia no cupim, a outra ficava na frente do animal, para impedir que este
desse um passo avante e o tarado se despencasse do monte de terra.
Contou-me
ele que em Dianópolis, minha cidade natal e palco dessas peripécias,
ficou famosa uma burra de nome Soraia. Consta que uma geração inteira
deliciou-se com o sexo gratuito desse animal dócil e compreensivo. A
burra estava tão acostumada com tais práticas, que ao se aproximar dela
e ante um leve passar de mão por sua crina, levantava o bonito rabo,
deixando o caminho aberto para o animalesco ato.
Soraia
despertou paixões. Ficou muito conhecido um caso inusitado: dois
sujeitos, acostumados com a burra, foram até o pasto e lá encostaram-na
próximo a um cupim. Enquanto um “fazia amor”, o outro a segurava pela
cabeça, para evitar que se movimentasse. Num êxtase enlouquecido,
prestes a atingir o clímax, o garoto de trás gritou quase implorando,
para o da frente: - Beija aí, beija aí! Obviamente, não dava para
trocar beijos com aquela bocarra, de lábios grossos e língua áspera.
Outros
animais foram vítimas dos garotos daquela época. No interior, onde fazer
sexo com uma mulher era muito mais difícil e geralmente acontecia numa
idade mais avançada, mesmo assim nos cabarés, o jeito era aliviar as
tensões com os bichos disponíveis. Segundo fiquei sabendo, a coisa era séria
e até despertava ciúmes. Havia a porca do fulano, a bezerra do beltrano
e a burra do cicrano. Essas eram “amantes” permanentes de alguns
poucos privilegiados, e infeliz do engraçadinho que ousasse pular um
chiqueiro ou curral e cometesse a insensatez de um “adultério”. Nem
sei como não aconteceu de nascer porco com cabeça de gente ou gente com
cabeça de porco. O fato é que essas coisas aconteciam, por mais
esquisitas que possam parecer. O leitor já reparou que existem muitas
pessoas que se parecem com bichos? Pois é, são resquícios dos desvios
sexuais vividos pelos pais, na adolescência.
*Dídimo
Heleno Póvoa Aires – advogado e escritor.