O Ano do Ócio
DÍDIMO
HELENO PÓVOA AIRES*
19/03//2006
Talvez não exista no mundo um país que tenha tantos feriados como o Brasil. E acrescidos os do Tocantins, com os seus próprios, teremos muitos dias de descanso neste ano. Verificando o calendário, constatei que são mais de 30 dias de folga. Ou seja, considerando as férias a que têm direito os trabalhadores, serão 60 dias de papo pro ar.
Os servidores públicos se esbaldam com tal notícia, afinal aproveitam para viajar (os que podem!) ou simplesmente descansar. Ou cansar de tanto descanso. De outro lado, os comerciantes sempre reclamam, com alguma razão, de que o comércio sofre com tantos feriados, pois a economia é diretamente afetada. Mas isso é relativo, visto que, para os lojistas de shopping, donos de cinema, donos de bares e restaurantes, principalmente os que possuem comércio nas praias, os feriados movimentam ainda mais os seus negócios. Muito feriado pode ser positivo para alguns setores da economia. É como aquela história de dizer que tempo bom é o que faz sol e tempo ruim é o chuvoso. Nesse caso, depende do ponto de vista: para um agricultor, que depende da chuva para obter uma boa colheita, tempo bom é chuva; para o turista, tempo bom é sol.
Mas, voltando aos feriados, 2006 será o ano da esbórnia, da preguiça, da sombra e água fresca e do ócio. Só para se ter uma idéia, começaremos com os quatro dias de carnaval (25,26,27 e 28 de fevereiro), seguidos dos dias 18 (Autonomia do Tocantins) e 19 de março (dia de São José, padroeiro de Palmas); depois, a Páscoa (14,15 e 16 de abril), além de Tiradentes (dia 21, que cai numa sexta-feira); a seguir, 1º de maio, numa bruta segunda-feira, e 20 (aniversário de Palmas). Em junho, Corpus Christi cairá numa quinta-feira, dia 15 (você acredita que a sexta será dia útil?). O 7 de setembro cairá também na quinta, seguido do dia 8 (Nossa Senhora da Natividade, padroeira do Estado), sem falar no dia 5 de outubro (criação do Tocantins). Finados, no dia 2 de novembro, também cai numa quinta, e o dia 15 (Proclamação da República), numa quarta. Para finalizar o ano, o Natal e o Ano Novo cairão num belo domingo, seguidos de uma segunda-feira mais bela ainda.
O Judiciário goza de dois feriados especiais: 11 de agosto, dia do advogado, e 8 de dezembro, dia da Justiça. Mas ainda não acaba por aqui. Com os jogos da Copa do Mundo, certamente o expediente estará irremediavelmente prejudicado. Na primeira fase, a Seleção Brasileira joga no dia 13 de junho às 16 horas, no dia 18 às 13 horas e no dia 22 às 16 horas. Caso o nosso time chegue até a grande final, abanaremos nossas bandeirolas também no dia 27 de junho, ao meio-dia, nos dias 1º e 05 de julho, às 16 horas e, finalmente, no dia 9 de julho, às 15 horas. Se para você é pouco, lembre-se de que teremos 53 domingos neste ano. São quase 100 dias de descanso. Os pobres deputados, que reduziram suas férias para míseros 55 dias, terão quase 150 dias para visitar seus redutos eleitorais. E assim caminham o Brasil e a humanidade.
No conhecido ensaio do filósofo Paul Lafargue, intitulado “Direito à Preguiça”, considerado um manifesto contra o capitalismo, o autor afirma que o cidadão deve ter seus grandes dias de ócio, pois ele é até mais eficaz e produtivo do que o trabalho excessivo. Como os capitalistas daquela época, também os de hoje não engolem a tese de Lafargue e não enxergam com bons olhos esse negócio de feriado. Quanto ao trabalhador, certamente ele não será hipócrita em dizer que acha tudo isso ruim; mas é recomendável que tenha a responsabilidade de reconhecer que há, quanto ao número de feriados, um inegável exagero.
*Dídimo Heleno Póvoa Aires – advogado.