A visita do Papa

 

 

 

DÍDIMO HELENO PÓVOA AIRES*  

 

28/04/2007

 

 

O papa virá ao Brasil, em maio. Os cristãos católicos estão animados, como não poderia ser diferente, afinal o Pontífice é o representante de Deus aqui na terra, como acreditam muitas “ovelhas” espalhadas por aí. As outras religiões não se importam muito com isso, o que também é compreensível, uma vez que elas têm os seus próprios líderes. Na verdade, o Papa assumiu o trono de Pedro, que era apóstolo de Cristo. Como Pedro foi um dos mais influentes seguidores do Mestre, e Ele é o filho de Deus, o título de representante do Criador dado a Bento XVI, visto por esse ângulo, é mais que justo.

 

Tudo é questão de fé. Os mais céticos poderiam questionar: onde está a procuração que foi passada por Deus à Igreja, dando-lhe poderes para escolher o seu representante? Ateus poderiam também perguntar: Deus existe? E se existe, fundou uma Igreja? Escolheu um povo? O Antigo Testamento mostra claramente que aquele Deus que ali é descrito fez uma nítida opção pelos hebreus, resgatando-os das mãos dos seus algozes egípcios, e deu-lhes de presente Canaã, a “terra prometida”. Confesso que fiquei com ciúmes quando li o Pentateuco. Mas ciúmes é sentimento de quem tem pouca fé.

 

Em outras oportunidades já disse que a Bíblia é fantástica, de leitura obrigatória para  ateus e crentes, para agnósticos, profetas e anarquistas. O mais interessante é que todos encontram justificativas ou para nela acreditar ou para repudiá-la. Daí já se tira a conclusão de que não são livros banais. Podem fazer estremecer o mais materialista dos homens. Maria está lá, descrita como a mãe de Jesus, mas os protestantes preferem não aceitá-la como santa e virgem. É uma questão de ponto de vista, de interpretação. Mas há dois grandes personagens, sem dúvida: Deus e Jesus. Estes, que na verdade são três, Pai, Filho e Espírito Santo, segundo a Santíssima Trindade, tese dificílima de se explicar, dominam o Antigo e o Novo Testamento, respectivamente. O Deus do Antigo castiga. O do Novo perdoa.

 

Naquele tempo, Jesus costumava causar uma certa inquietação por onde passava, afinal tinha um discurso ousado e corajoso, dizendo em alto e bom som ser o filho de Deus. E isso tudo diante dos romanos, que exerciam o Poder na região. É de se imaginar que não era um homem comum. Mas toda a sua trajetória foi pautada por humildade, amor, paz, perdão e misericórdia, chegando até a incentivar que o fiel virasse a outra face quando lhe batessem na de cá. O Deus do Antigo Testamento não permitiria um desaforo desse. Seria castigo certo.  

 

Hoje os tempos são outros, não se vê mais profetas e líderes religiosos como antigamente. E a visita de Bento XVI ao Brasil é uma prova disso. Sua chegada é esperada aos moldes de um pop star. O Vaticano exige aposentos especiais; esculturas sacras que apodrecem há anos nos porões do Mosteiro de São Bento, em São Paulo, serão restauradas, palcos estão sendo montados e as televisões não falam de outra coisa. Uma estrada por onde passará o Pontífice, que visitará uma fazenda de recuperação de viciados, será devidamente asfaltada, somente para recebê-lo. De luxos assim não gozava Jesus. Andava com sandálias humildes, túnica simples. Seu transporte era, no máximo, um jumento, mas somente em ocasiões especialíssimas.

 

Não se sabe se, com toda a tecnologia de que hoje dispomos, Jesus aceitaria, ou não, essas regalias. Creio que não. É de se levar em consideração que o Papa merece e tem o direito de se sentir protegido e tratado com decência.  Mas o certo é que toda essa pompa e todo esse esplendor parecem demais, exagerado e um tanto desproporcional para um líder de uma religião que costuma vangloriar os pobres e a pobreza.

 

*Dídimo Heleno Póvoa Aires – advogado e membro da Academia Palmense de Letras.

 

       

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