20/02/2005
José Cândido Póvoa jcpovoa@hotmail.com
O menino era magricela, cabelos crespos, canelas finas e barrigudinho. Pela aparência, todos poderiam afirmar que passava fome. Mas não era nada disso, tratava-se tão somente da mostra de um traço genético. Em sua família não existia nenhuma criança robusta e ele não seria exceção. Seu apelido: Juquinha. Amigo de infância e adolescência na minha querida Dianópolis. Trinta e quatro anos sem encontrá-lo até que certo dia, aqui numa rua de Palmas, sinto um toque no meu ombro. Percebi tratar-se de um amigo. Os amigos verdadeiros têm o dom de serem reconhecidos até num quase imperceptível toque de mão. E com surpresa reconheço meu amigo de antigos e agradáveis momentos. Depois de um demorado abraço, daqueles que vai absorvendo as saudades e lembranças guardadas no fundo do coração, sentamo-nos num banquinho ali na rua mesmo, quando notei que ele estava ávido por falar. - Você, como amigo que é, sabe e conhece muito bem a minha vida. Ainda adolescente, aos dezessete anos, ajudei a criar e fui eleito como presidente do primeiro e único grêmio estudantil da nossa cidade e no mesmo ano, ajudei a organizar o maior congresso estudantil que nossa cidade sediou, quando tive a oportunidade de conhecer muitas pessoas, entre elas políticos que já batalhavam pela criação do Estado do Tocantins. Aos dezoito anos fui aprovado no concurso público para trabalhar no Banco do Estado de Goiás. Com essa mesma idade tive que deixar nossa terra para continuar os estudos na capital, levando na bagagem, apenas a dignidade e moral do meu lar, além dos trocados que me sobraram do último salário recebido daquela instituição financeira. Na cidade grande, como peixe fora d’água, fui morar, juntamente com meus primos e alguns amigos, entre eles Tode (Pixurí), Janjão, etc... numa república de estudantes, onde todos trabalhavam durante o dia e estudavam a noite. Nunca tivemos, as benesses de apartamentos ou casas montadas pelos nossos pais e muito menos estudos e livros pagos pelo sacrifício dos mesmos. Sabíamos juntos enfrentar a realidade e a dureza da vida. Como bem sabe,aos vinte e um anos, como vice prefeito da nossa terra natal, fui uma espécie de embaixador, tendo em vista a amizade que desfrutava com o governador. Lembro-me que o carnaval, que sempre foi muito animado em nossa cidade,em determinado ano, só foi realizado pela minha intervenção, levando de avião o técnico para o conserto da “usina da luz”. Consegui reformas de escolas e construção de quadras de esportes. Galguei alguns postos de relativas importâncias na esfera estadual, graças ao meu esforço e as boas amizades que sempre conquistei. Deus deu-me o discernimento de fazer e preservar somente boas amizades. Fui sempre consciente de que o cargo não faz o homem, mas o homem que faz a importância do cargo. Sempre tive preocupação com meus amigos e familiares. Quando possível e o dinheiro curto permitia, ali estava eu para beber um pouco da sabedoria de minha querida mãe, (meu pai morreu um ano após minha saída de lá) e da convivência sadia com minha família. Agora, fico sabendo que muitos criticam-me por ter abandonado a minha terra natal. Mas nunca perguntaram-me se necessitava de alguma coisa. Com o coração entristecido, fico na dúvida se não conhecem a verdadeira história de um filho da nossa terra ou se o fazem por maldade. Fitei-o com carinho e ponderei: - São coisas da humanidade meu querido amigo. Por acaso conhece a passagem das Sagradas Escrituras, onde Jesus, mesmo operando milagres, não foi reconhecido em sua própria terra natal? Não se preocupe com o que dizem, para o homem o que conta é a sua consciência. Juquinha levantou-se e agradeceu. Marcamos novos encontros. Quando o vi atravessando a rua, de cabeça erguida, pronto a enfrentar e vencer novos e difíceis desafios, o que sabe muito bem fazer, tive a nítida impressão que de agora em diante ele tem plena consciência que realmente santo de casa não faz milagres.