SEM SENTIDO
DÍDIMO HELENO PÓVOA AIRES*
30/05/2005
A vida, na sua banalidade cotidiana, torna-se meio sem sentido, o que me
faz refletir: qual a razão da existência, afinal? Nascemos sem pedir,
paridos sem quê nem pra quê, alguns ainda têm a má sorte de serem
filhos de pais horripilantes, com irmãos piores ainda, numa família
totalmente desconjuntada. E eu fico pensando: por que muitas pessoas
sofrem tanto? Caem neste mundão sem nenhuma explicação, ficam velhas,
pobres, feias e, finalmente, morrem. Qual o sentido disso tudo?
Outros, como diz o povo, nascem com aquilo virado pra lua. Tudo dá certo.
Mas esses fazem parte de uma privilegiada minoria. No geral, o homem veio
aqui pra sofrer. Ninguém, por mais que tenha uma vida considerada boa,
consegue ser plenamente feliz, pois já deu para perceber que a tão
almejada felicidade resume-se a “momentos efêmeros”.
Com algum dinheiro no bolso, o sujeito consegue prolongar a duração
desses momentos. Obviamente, é preferível ser um infeliz rico do que um
infeliz pobre. Mas, o que se quer neste artigo, é discutir sobre o porquê
de tudo isso. Sei que vão me dizer que estamos aqui para ser salvos e
conquistar o reino dos céus. Tudo bem, mas quem escolheu vir até aqui,
passar por tudo isso e conquistar o céu? Por que não fomos direto ao
Paraíso, sem precisar passar por esta etapa? Esse negócio de ter que
morrer é muito chato.
E os nossos amigos? E as pessoas queridas de nossas vidas? Será que as
encontraremos depois da morte? Uma vida inteira de convivência, de amor,
dedicação, afeto, carinho, sexo e tudo o mais, é suficiente para
garantir a continuidade depois? O sujeito trabalha, luta, tenta de tudo na
vida e, no final do mês, paga a conta de água, luz, telefone, aluguel,
escola para os filhos, o supermercado, o combustível do carro (os que têm),
atrasa algumas prestações, vai levando aos trancos e barrancos,
aposenta-se, sofre desvairadamente, e, antes de morrer, geralmente contrai
alguma doença, sofre um pouco mais, dilapida o patrimônio, dá despesa
para os parentes vivos e, finalmente – para a felicidade geral –
morre. Outras pessoas acabam seus dias num asilo, sozinhas, abandonadas
pelos filhos, sem amparo, sem carinho, sem nada. Qual a razão de tudo
isso?
Aqueles velhinhos felizes, saudáveis e rodeados por netos, só aparecem
nos comerciais de margarina. Na vida real, é bem diferente, com raríssimas
exceções. Como diz o meu amigo Dianarí, na medida em que envelhecemos nós
nos tornamos menos importantes. Velho rico é coisa rara neste país.
Aqueles helicópteros de plano de saúde, rápidos e eficientes, só
pousam em minguados heliportos. A maioria dos idosos doentes brasileiros
costuma sair às pressas nas velhas ambulâncias de nossas prefeituras, ou
nalgum avião fretado por um político qualquer, quando tem muito voto
para oferecer em troca.
Os amigos, aqueles verdadeiros, quase sempre vão morar bem longe. Tomam
rumos diferentes, seguem vidas diferentes, se casam com mulheres insuportáveis
que implicam com suas velhas amizades de infância e, de vez em quando,
aparecem para tomar uma cerveja e chorar as mágoas. E todo mundo
preocupado em ganhar dinheiro, loucos por uma posição melhor na
sociedade, um status qualquer para ser recebido nas altas rodas,
fazer amizades falsas e fingir que são felizes. Quanta mediocridade!
Enquanto isso, a vida passa bem ao nosso lado, imperceptivelmente.
De felicidade para o povo brasileiro, resta o futebol, as novelas da Globo e o sexo. É muito pouco. Mas, para alguns, também resta a esperança do aguardado encontro com Deus. Por incrível que pareça, mesmo nesta vida sem sentido, ninguém quer morrer e, sempre que aparece uma oportunidade, vociferam de peito aberto: “como é bom viver!”. É o instinto de sobrevivência. Só pode ser.
*Dídimo Heleno Póvoa Aires – advogado.