O PODER DA LEITURA
DÍDIMO HELENO PÓVOA AIRES*
31/08//2005
Na
época da Copa do Mundo, no ano de 2002, realizada na Coréia, chamou-me a
atenção – além do próprio time, que apresentou um desempenho
surpreendentemente muito bom – o comportamento da torcida. Num desses
jogos, o estádio estava completamente lotado de coreanos vestidos de
vermelho e fazendo uma algazarra do início ao fim da partida. O locutor
nos informou que ficou admiradíssimo com a disciplina e respeito dos
cidadãos no momento em que se preparavam para entrar em campo. Todos
perfilados, tranqüilos, esperando a sua vez, sem empurrões, sem pontapés,
sem cusparadas e sem qualquer tipo de violência.
Aqui
no Brasil a coisa teria sido bem diferente. Certamente muitas cenas
tristes seriam presenciadas na porta de um Maracanã em dia de jogo de
Copa do Mundo. Gente é igual a cachorro, uns têm pedigree, outros são
vira-latas. E isso não tem nada a ver com poder aquisitivo. Existem
pessoas da classe média alta que são
verdadeiros trogloditas. Aliás, novos ricos são, geralmente,
desprovidos de comportamentos decentes, pois trazem arraigados os velhos vícios
da época de vacas magras. Atender ao telefone celular aos berros, fazer
gestos obscenos no trânsito, atirar lixo no meio da rua e ouvir o som do
carro no último volume, são atitudes comuns presenciadas em todos os
cantos de todas as cidades do País. São seres que adquirem dinheiro mas
não adquirem cultura e educação.
O brasileiro médio é muito mal-educado. As razões – como estamos cansados de saber – é a falta de acesso à escola e o analfabetismo crônico, que gera o desapego ao hábito da leitura. Basta dizer que somente na cidade de Buenos Aires, na Argentina, existem quase tantas livrarias quanto em todo o Brasil. Conheço muitas pessoas que nunca abriram um livro, que nunca ouviram falar em muitos dos nossos escritores. São pessoas que apenas assistem a novelas. Não que eu seja contra novelas, mas a leitura é fundamental para a formação cultural e intelectual das pessoas. É preciso ser menos alienado para diversificar o campo de conhecimento. Até bula de remédio deve ser lida, nem que seja durante a satisfação das necessidades fisiológicas. Falta de leitura gera violência.
As
estatísticas mostram que o número de pessoas que freqüentam a escola
aumentou, que a educação melhorou. Talvez tenha melhorado em quantidade,
não em qualidade. As escolas públicas estão praticamente proibidas de
reprovar alunos e o resultado de tudo isso são pessoas que, embora tenham
passado pelo ensino médio, não sabem sequer escrever um bilhete, muito
menos elaborar um ofício ou requerimento.
Por
tudo isso, fica fácil perceber o porquê de aqui se matar com tanta
facilidade, o motivo de os estádios se transformarem em praças de guerra
e a razão pela qual não podemos andar pelas ruas com segurança. Estou
convencido de que um dos nossos grandes problemas é a falta de leitura.
Como acreditar num povo que não lê? O hábito da leitura pode ser
utilizado como instrumento para se saber se vale a pena conviver com alguém.
Quanto mais livros a pessoa tiver lido, mais se pode investir numa possível
amizade. É batata, não tem erro: gente que lê tem pedigree. Quem não lê
é vira-lata.
Dificilmente
encontraremos um assaltante que já leu a obra do russo Tolstoi ou algum
livro do Machado de Assis ou muito menos um poema do Drummond. Traficantes
também não são adeptos da leitura. Psicopatas cultos, como aquele do
filme Hannibal, ou são estrangeiros ou fazem parte de obras fictícias.
Dificilmente se encontra um psicopata brasileiro de QI elevado – e olha
que, geralmente, esses são tipos de criminosos que trazem a inteligência
como característica. Lembremos do famoso
“Maníaco do Parque”, por exemplo: deve estar lendo a Bíblia na
cadeia. Se ele tivesse adquirido esse hábito desde cedo, talvez não
tivesse cometido todos aqueles bárbaros assassinatos. Ou ao menos teria
matado com mais classe.
*Dídimo Heleno Póvoa Aires – advogado.