ÓCIO REMUNERADO

 

 

DÍDIMO HELENO PÓVOA AIRES*  

 

01/10/2005

 

 

Uma das práticas mais asquerosas da política é a de remunerar quem não trabalha. Se fôssemos analisar as folhas de pagamento de diversos órgãos públicos por este país afora, depararíamos com absurdos inimagináveis. São muitos os parentes de políticos e pessoas influentes que ganham religiosamente o seu salário por mês, sem nunca ter pisado o pé no local do suposto trabalho. Na verdade, uma rápida pesquisa pelos Diários Oficiais dos estados brasileiros seria suficiente para constatar essa calamidade.

 

Outra prática repudiada é o nepotismo, embora haja quem defenda que se o parente possui reconhecida qualificação, sendo um bom servidor e freqüentador assíduo do trabalho, é razoável admitir que ocupe um cargo onde se exija extrema confiança, ao argumento de que seria hipocrisia imaginar que, apenas por motivos consangüíneos, fosse concedido o lugar a um desconhecido sem qualificação. Em casos como esse, pensam alguns que é bem mais lógico dar oportunidade a quem se deposita maior confiança, principalmente quando a competência e a honestidade do agraciado são incontestáveis. Pode ser.

 

Mas receber sem trabalhar é inadmissível. O pior de tudo é que tais práticas não passam despercebidas, visto que as nomeações são estampadas nas páginas dos Diários, para quem quiser ver. A não ser os comentários e sussurros trocados ao pé de ouvido, nada mais se faz para coibir esse tipo de costume. E até as pedras sabem quem são muitos desses privilegiados que têm apenas o trabalho de sacar a quantia adquirida sem qualquer esforço. No intuito de agasalhar esse tipo de gente, criam-se inúmeras nomenclaturas, tais como assessores, consultores e secretários especiais. De fato, são mesmo especiais esses seres ociosos, que “mamam nas tetas” do Erário.    

 

O Brasil atravessa um momento de grave crise moral. Mas das crises também é possível retirar grandes lições; o Poder Público está diante de uma ótima oportunidade para acabar com esses abusos, dando um bom exemplo à Nação. No que diz respeito à remuneração dos ociosos bastaria adotar o sistema de ponto nas repartições públicas. Quem não trabalha poderá ser justamente demitido por abandono de cargo, uma vez que muitos até moram em cidades distantes do local em que são lotados. 

 

Acabar com a imoralidade é fácil. O problema é que são tantos os envolvidos e tantos os interesses, que a maioria simplesmente ignora, sabendo que também poderá utilizar desse expediente em benefício de seus protegidos. Faltam, muitas vezes, homens decentes, que coloquem em prática o discurso que proferem. Ao homem público não basta proclamar-se honesto, bom caráter, defensor da moralidade e dos bons costumes. É preciso, antes de tudo, que pratique, efetivamente, o que prega. O PT está nos dando uma lição de como não se deve agir; suas vísceras foram expostas e descobrimos, estarrecidos, que se trata de um Partido tipicamente brasileiro, repleto de defeitos e vícios, infestado de corruptos por todos os lados. 

 

Triste é constatar que o presidente Luiz Inácio estava enganado quando disse que no Congresso havia trezentos picaretas. Há muito mais. E não é só na política que eles proliferam; estão presentes na sociedade e na família, de modo geral. Já se contam anos, no Brasil, em que ser honesto é motivo de chacota. “Esperto” é quem vende o carro com o motor na iminência de fundir; é quem compra e não paga; é quem desvia o dinheiro público; é quem sonega imposto; é quem aceita propina e, principalmente, quem recebe e não trabalha. Com tantos valores invertidos, não nos surpreende o fato de que, se as eleições fossem hoje, o Roberto Jefferson provavelmente seria um dos deputados mais votados. Ao povo não importa que ele seja corrupto: o importante é a sua coragem e o seu carisma. É um absurdo, mas é verdade.

 

*Dídimo Heleno Póvoa Aires – advogado.

 

 

       

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