Impostores da fé
DÍDIMO HELENO PÓVOA AIRES*
A Internet facilitou a comunicação, isso é fato. Mas há excesso de bobagem circulando pela rede mundial. Volta e meia recebo textos cuja autoria é atribuída a Luis Fernando Veríssimo, Mário Quintana e Machado de Assis, mas que, na verdade, são de autores desconhecidos. Outro material bem divulgado, como não poderia deixar de ser, é o sexo. Aparece de tudo: fetiches, taras e bizarrices de toda espécie. E o pior é que isso está disponível a qualquer um, incluindo crianças.
Dos muitos e-mails que recebo, alguns nem tenho o trabalho de verificar. Pelo título é possível perceber se o assunto é sério ou não. É o caso daquelas correntes insuportáveis. Dia desses, depois de ler um texto bem longo, fui ameaçado de ser queimado até a morte no fogo do inferno ou ser acometido por uma impotência sexual instantânea, caso não encaminhasse a mensagem a outros cinqüenta infelizes. Alguns textos garantem milagres com hora marcada, desde que se cumpram algumas exigências. Até já prometeram que o meu desejo seria concretizado às onze e cinqüenta e sete da noite. Chegada a hora, nada aconteceu, como previsto.
Em meio a todo esse lixo, o que mais me impressiona é a divulgação de pregadores fajutos, que se passam por curandeiros, milagreiros e profetas. Num e-mail que recebi aparece a foto de uma igreja onde se vê escrito em letras garrafais na porta: “O pastor Lúcio Hermano, que morreu após uma facada no coração estará contando o seu testemunho e agradecendo a Deus pelo milagre!”. O mais incrível é que as pessoas acreditam mesmo nisso, e certamente lotaram esse templo para assistir a palestra do morto-ressuscitado. E, claro, ao final do culto é possível imaginar que tenha corrido aquela famosa “sacolinha”.
Esses impostores estão por toda parte. Hoje somos obrigados a suportar, pela televisão, horas e horas de cultos e missas, que são transmitidos em rede nacional. As televisões vendem o espaço e essas igrejas mostram ao vivo a cura de muitos fiéis. Vi uma mulher ser curada da devastadora enxaqueca que a incomodava há anos, com um leve toque da mão do pastor em sua fronte. Só não deu para saber se ela sentia mesmo as tais dores. Gripes, pneumonia, reumatismo, lesões lombares e outros infortúnios, são curados bem na cara do telespectador.
Mas o que mais me deixou impressionado foi o poder de um tal “Pai Ambrósio”. No e-mail que recebi aparece um cartaz pregado num poste, com os seguintes dizeres: “Resolvo os problemas amorosos e profissionais. Curo qualquer doença (até viadagem). Curo qualquer vício. Encontro cão perdido, tiro unha encravada e fimose”. Vejam vocês quantos cachorros se perderam pela vida simplesmente porque os donos não sabiam da existência do pai Ambrósio. De tudo que já vi, é o primeiro sujeito que promete encontrar cão perdido. Para o curandeiro, homossexualismo é doença e, portanto, ele também oferece a cura para essa “enfermidade”.
Esses milagreiros e profetas se multiplicam como coelhos. Um amigo meu, ouvinte assíduo de rádio, está contrariado, pois seus programas da madrugada foram invadidos por longos cultos e pregações dos mais variados líderes religiosos. Vivemos uma época difícil e muitos se aproveitam disso para ganhar dinheiro fácil, através da ingenuidade das pessoas. Um sujeito chamado Carlos Magalhães apareceu na minha caixa de e-mail garantindo que é o descobridor da quarta parte da mente humana, a maior conquista da psicanálise, depois de Freud. Deve ser justamente essa quarta parte a responsável pelo armazenamento de tanto entulho eletrônico.
*Dídimo Heleno Póvoa Aires – advogado, membro das Academias Palmense e Tocantinense Maçônica de Letras.